Minimizar a inadimplência

31 de março de 2020
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Palavra do Presidente da FCDL-RS

A situação é que o processo de isolamento social para combater o coronavírus atingiu em cheio a economia brasileira e mundial. Isto é fato e não uma mera opinião de viés político. A situação criada realmente é de exceção.

O mercado foi paralisado à força e isto gera graves repercussões em cadeia, podendo nos levar a uma situação de depressão econômica até pior do que a recessão iniciada em 2014 e que se prolongou em várias atividades até 2019.

Nestes casos de calamidade – o que foi declarado pelo próprio governo federal, vários estados e municípios – as regras básicas da funcionalidade econômica simplesmente deixam de existir: pessoas param de trabalhar; estabelecimentos produtivos são obrigados a fechar suas portas.

A falta de movimento econômico logo acaba com as reservas dos trabalhadores e empresários, levando a uma disseminação de inadimplência, o que simplesmente detona com a confiabilidade entre as relações comerciais.

E esta quebra de confiança chega a ser, no médio e longo prazo, até mais grave do que a eventual falta de dinheiro para pagamento à vista. O governo federal está bem ciente da quebra de normalidade que falamos.

Apoio a desempregados e informais; aporte de capital de giro para empresas; suspensão temporária de pagamentos dos empréstimos ao BNDES; e até das parcelas das dívidas e estados e municípios com a União constam no rol de medidas de mitigação da crise. Entretanto ainda não há um antídoto formalizado contra a inadimplência e queremos colaborar neste sentido.

O fato é que mesmo sendo auxiliado pelo governo em caso de desocupação, grande parte dos consumidores está tendo uma frustração inesperada de renda, o que compromete não apenas suas decisões de compra e sua capacidade de pagamento das prestações assumidas anteriormente ao Decreto de Calamidade Pública. Esta inadimplência gera um efeito dominó em toda a cadeia produtiva.

Mesmo que parcialmente isto seja coberto no curto prazo pela suplementação de capital de giro ofertada pelo BNDES, a questão é que o fato gerador do problema: o atraso ou não pagamento de contas, faz com que fique à descoberto uma grande hemorragia de falta de credibilidade do mercado quanto à adimplência de milhões de consumidores que até pouco tempo estavam com suas obrigações em dia, no entanto tiveram sua renda disponível esfacelada pelas medidas de isolamento para conter o COVID 19.

Neste sentido é que sugerimos a algum agente financeiro estatal (Caixa ou BNDES) disponibilizar, singularmente aos comerciantes e prestadores de serviços, algo análogo a uma securitização de suas contas a receber. Exemplificando: o Sr. ABC não paga a prestação do televisor que adquiriu na loja XYZ.

Dado o acontecido, o estabelecimento acessa o agente financeiro oficial, que cobre a despesa da inadimplência, arbitrando-se um período de carência equivalente ao “estado de calamidade pública em vigor” somado a igual espaço de tempo para o restabelecimento das relações produtivas.

A partir daí se estabelece um prazo para pagar parceladamente o agente financeiro (diríamos, 24 meses), remunerado com os juros básicos (SELIC – como já em vigor em outras operações emergenciais), condição esta que é totalmente repassada ao consumidor, para que este possa quitar seus débitos originários neste período de exceção, sem prejudicar excessivamente o consumo futuro.

Lógico que esta sistemática deverá ser adotada com as pessoas que não tinham histórico de inadimplência antes da calamidade provocada pelo COVID 19. Uma consulta ao SPC resolve esta questão.

Adicionalmente pode ser estudado um mecanismo no qual, caso o comprador não honre o pagamento de suas faturas em atraso causadas pela situação atual, esta titularidade de dívida seja repassada para o agente financeiro oficial, que passaria a ter o direito de cobrança, o qual compensaria a dívida do estabelecimento produtivo. Esta é uma proposta inicial de algo inédito, sendo, é claro, factível de aperfeiçoamentos e até contraposições.

No entanto, é fundamental que no momento atual os agentes públicos estejam sensíveis aos grandes problemas causados pelas inadimplências decorrentes das definições de políticas, mesmo que estas estejam focadas em combater uma calamidade. Somos irrestritamente favoráveis à economia de mercado, com o mínimo de interferência do setor público nas relações comerciais.

Porém, havemos de reconhecer que estamos vivendo uma situação excepcional, onde a normalidade simplesmente deixou de existir. E neste caso, é válido, sim, algum tipo de interferência governamental no sentido de evitar que o flagelo sanitário dê origem ao flagelo econômico, o qual multiplicará novas crises sanitárias por conta da pobreza e do desabastecimento.

 

Vitor Augusto Koch


Presidente da FCDL-RS

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